terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Há quem queira a verdade toda. Fiquem lá com ela, que alguém tem de ficar com a campainha da bicicleta.

(...) a verdade não é coisa preexistente a descobrir, mas em todos os domínios, mesmo no científico, é sempre objecto de uma criação, sempre produto de sentido, isto é, como reformulação dos dados dos problemas, invenção de novas condições, suscitação de novos modos de ver, de sentir e de pensar: toda a verdade interessante se estabelece como crítica, ou “falsificação”, de outras verdades, de ideias preestabelecidas. A verdade depende sempre do sentido, não o inverso, e o sentido de uma coisa é a sua novidade, a sua singularidade, o seu interesse, a sua criação da possibilidade de novas percepções, afecções ou ideações. É esse, com efeito, o mais elevado poder do pensamento: não a da faculdade da verdade, mas a do novo, a da criação de sentido. Isto é particularmente nítido na filosofia e é isso que a aproxima muito mais da arte do que da ciência.
Eduardo Prado Coelho interpreta esta perspectiva de Deleuze como correspondendo a uma passagem do paradigma científico, funcionando por argumentos e controvérsias, a um paradigma estético definido por linhas de energia e de sentido. Com efeito para Deleuze, filosofar não é saber, mas criar.
Como todas as coisas, a filosofia não pode querer ter razão contra a sua época. Mas a filosofia pode e deve ter razão antes dela, como força criativa e de antecipação de novas possibilidades. Então, sendo o mundo um imenso dispositivo de comunicação, há uma responsabilidade que a filosofia deve assumir desde já: descomunicar, introduzir curto-circuitos na comunicação. Filosofar é ter vergonha. Vergonha dos homens, vergonha de ser homem. E essa vergonha não tem de ser exclusivamente motivada pelas grandes tragédias absurdas, guerras e barbáries, mas também por situações irrisórias, quotidianas, uma afirmação, uma conversa, uma extrema mediocridade do pensamento, o discurso de um homem do Estado, um programa de TV.
A filosofia deve servir, pelo menos, para irritar os imbecis, para envergonhar a estupidez, para fazer da estupidez algo de vergonhoso.

Segundo Deleuze, através dos modelos de racionalidade comunicativa, a filosofia nada mais faz do que colaborar, fornecendo instrumentos “validados” à tarefa social dos media. Graças a este sistema comunicacional, já não é necessário dominar os outros através da disciplina e da obediência, porque o controlo, o condicionamento do movimento livre, uma nova espécie de servidão voluntária vieram substituir a disciplina e a obediência. (de um texto meu em preparação; isto nunca mais acaba)

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