quarta-feira, 30 de abril de 2014

Problema do Conhecimento II

A palavra “representação” é uma palavra muito ambígua. Falamos de representações para nos referirmos a imagens, a símbolos, à atividade dos atores de teatro ou cinema, etc. A lista de significados possíveis dessa palavra é uma das mais ricas do dicionário. Aquilo que devemos reter no uso que aqui se faz do termo “representação” é que ele não se refere nunca a uma imagem ou cópia de uma coisa exterior, de uma coisa com realidade ontológica. Pelo contrário, devemos considerá-lo como referindo-se a uma re-apresentação de uma coisa previamente construída. De algum modo, Platão teve a intuição de que assim deveria ser o conhecimento, mas esteve muito longe de dar à sua perspetiva uma dimensão construtivista. A sua busca incessante do universal e imutável impedia-o de alguma vez equacionar o problema deste modo. A sua “re-apresentação” (reminiscência) seria a das Ideias do Mundo das Ideias, vislumbradas pela alma humana numa vida anterior.
Este conceito de “representação” aplica-se igualmente às representações ditas “icónicas”, como os desenhos e as pinturas. Se desenharmos numa folha de papel uma bicicleta, é possível que a maior parte das pessoas “reconheça” o desenho como representando uma bicicleta. Sublinhemos, desde já, a palavra “reconhecer”. O seu uso quer significar que essas pessoas veriam no desenho algo que já tinham visto antes. Poderíamos dizer que o desenho as faz repetir uma experiência conhecida. O mesmo se pode dizer da forma como os visitantes de uma galeria de arte representam no seu espírito os quadros que lá encontram expostos, ou da forma como cada um se representa mentalmente o sorriso da Gioconda.
Se mostrasse o mesmo desenho a um, digamos, indígena da Amazónia que nunca tivesse visto rodas nem bicicletas, não lhe seria possível representar a mesma coisa que representa a maioria dos indígenas da Europa. Para ele, o desenho nunca poderia representar uma bicicleta, porque não a reconheceria nele.
Este será, porventura, um exemplo banal e até improvável, mas ilustra bem aquilo que pretendo pôr em evidência, que mesmo uma representação icónica (de um desenho) só funciona através do recurso à evocação de experiências ou “conhecimentos” que já possuímos. Do ponto de vista construtivista, podemos formular esta tese, dizendo: uma re-apresentação só funciona se nos levar a executar uma operação (ou uma série de operações) que já tínhamos aprendido antes.
Passemos agora, então, a um exemplo de construção mental. Escolho uma situação muito simples, mas mesmo assim, inteiramente abstrata: a situação da criança que se encontra na fase de começar a aprender a formação do plural na sua língua materna.
Na língua portuguesa, isso é mais complicado do que, por exemplo, em língua inglesa, porque o fonema que indica o plural é mais variável. Em Inglês, com muito poucas exceções, o plural forma-se sempre com um “s” final. Mas não é o código fonémico que aqui está em questão. É, pelo contrário, o estádio anterior à codificação linguística, o estádio em que a criança aprende a distinguir os elementos experienciais sobre os quais constrói o conceito de plural.
(…)
Para “reconhecer” uma coisa, é preciso possuir uma espécie de estrutura modelo, mais ou menos permanente, com a qual possam ser comparadas as experiências atuais (a cada momento do presente). No entanto, embora possamos admitir que o processo, a que a criança recorre, até funciona muito bem, a verdade é que ele não é suficiente para que consiga reunir várias coisas reconhecidas sob o conceito de plural.
Para que tome consciência de que há uma pluralidade - neste caso, de ovos - é ainda necessário que a criança se aperceba de que realizou uma comparação com a sua estrutura modelo chamada “ovo” mais do que uma vez, e de que esta comparação conduziu a um resultado positivo mais do que num caso.
Este exemplo, apesar da sua simplicidade, mostra claramente que a atribuição de um plural a uma situação percetiva requer, para além do trabalho percetivo, uma operação reflexiva, isto é, uma espécie de consciência do que nós próprios fazemos. No exemplo dos ovos, é precisamente a consciência de ter reconhecido um ovo mais do que uma vez.
Se compreendeu este exemplo, poderá ser tentado a perguntar o que é que ele tem a ver com o problema das representações. Pois bem, já vimos que, para reconhecer um ovo, precisamos de ter uma estrutura modelo como termo de comparação. Digamos que esta “estrutura modelo” é um tipo de representação indispensável. Se não a tivermos, não seremos nunca capazes de recolher experiências a partir de um conjunto, de uma classe de coisas. Todas as coisas que isloamos no campo visual, por exemplo, seriam indivíduos e nunca seríamos capazes de concluir que um indivíduo é semelhante a outro.
Prosseguindo no exemplo até à construção do plural, é necessário introduzir um segundo tipo de “re-apresentação”, justamente aquela representação que é necessária para reconhecer essa operação reflexiva a que me referia quando fazia apelo à operação específica a que corresponde a formação do plural linguístico. Se não a reconhecermos como tal, não seremos nunca capazes de saber quando e em que condições devemos formar um plural.
Se aceitarmos esta análise, então teremos de falar de dois tipos de representações:
  • As re-apresentações de objetos sensoriais;
  • As re-apresentações de operações ou operatórias
O que é a filosofia (2013)
Jorge Barbosa

O Problema do Conhecimento

Em Português, temos alguma vantagem para compreender o problema do conhecimento tal como é habitualmente discutido, por dispormos de duas palavras, “saber” e “conhecimento”, que nos facilitam a compreensão de uma distinção muito importante: a distinção entre a atividade de conhecer e o seu resultado, o saber. (Em inglês, só se recorre a uma palavra para os dois conceitos, e esta característica linguística e cultural não é neutra).  
No entanto, esta distinção, facilitada na nossa língua por dispormos de duas palavras, torna-se muito complexa e difícil, não por razões lógicas, mas porque em todas as línguas e nos nossos hábitos de expressão somos fortemente influenciados pela tradição realista que sempre esteve presente na tradição filosófica ocidental. É extremamente difícil substituir o conceito de conhecimento como devendo produzir uma imagem do mundo real (imagem incompleta, talvez, mas mesmo assim imagem) pelo conceito de “acção”. Mas é precisamente esta substituição que é necessário fazer para compreender os fundamentos do construtivismo.
Todo o conhecimento é o resultado de uma acção ou de uma série de acções. Uma acção não surge por acaso. A acção dirige-se sempre para um fim - e o fim é necessariamente uma estrutura construída ou por reflexos inatos ou com base nas experiências do agente. Piaget mostrou muito bem como isso funciona no domínio da perceção e também no domínio da concetualização. Nos dois domínios, é o sucesso de uma ação ou operação que nos fornece a medida da sua validade. Neste ponto, o construtivismos aproxima-se claramente do pagmatismo, por exemplo, de William James.
Para se ter sucesso, todavia, não é uma imagem “correta” o que nos faz falta, mas sobretudo uma espécie de mapa que nos permita evitar os obstáculos que o mundo real poderá colocar no caminho das nossas acções. Por outras palavras, trata-se não de fazer uma cópia da estrutura do mundo real, mas sim de construir um mapa de itinerários, através dos quais nos podemos orientar no mundo e alcançar os fins que escolhemos.
Imaginemos uma noite sem luar. Encontramo-nos numa floresta e queremos encontrar o caminho para sair dela. Avançamos lentamente. A cada dois ou três passos, as nossas mãos encontram um obstáculo - uma árvore, uma pedra… - que nos obriga a desviarmo-nos do caminho que pretendíamos seguir. Após um certo tempo, se tudo correr bem, começaremos a ver as estrelas e apercebemo-nos de que finalmente conseguimos deixar a floresta para trás. Se nessa altura nos questionarmos sobre o que realmente sabemos a respeito daquela floresta, só podemos dizer uma coisa que ficamos a saber: um caminho possível de saída, uma forma de a atravessar, de passar por ela. Este saber só foi adquirido, avançando, superando os obstáculos que nos afastavam da saída e tendo em conta os nossos próprios movimentos que nos conduziam pelo caminho possível. É neste preciso sentido que podemos falar do saber que nos permite caminhar através do mundo e da vida, e não como um conjunto de informações, como a tradição aristotélica, consolidada agora pela informática, nos legou.

O que é a filosofia (2013)

Jorge Barbosa

terça-feira, 22 de abril de 2014

A Saída Porca da Troika

Portugal pode ter uma saída limpa do programa de assistência, pode ter uma saída suja, ou pode ter, e certamente terá, uma saída às fatias porque há algumas pessoas que verdadeiramente não entraram.
Mas a Troika, pelas declarações e relatórios que produziu, já garantiu uma saída suja. A isto, chama-se determinação.
Esperemos para ver o que fará este governo.

Noticias ao Minuto - Os nossos políticos são "uns garotos ignorantes"

http://www.noticiasaominuto.com/pais/206999/os-nossos-politicos-sao-uns-garotos-ignorantes?utm_source=gekko&utm_medium=email&utm_campaign=afternoon#.U1aaw7fVDCI.email

Sérgio Godinho TV: "Sérgio Godinho - Liberdade@Coliseu 2004"



Enviado do meu iPod


Assunto: Sérgio Godinho TV: "Sérgio Godinho - Liberdade@Coliseu 2004"

Sérgio Godinho TV: "Sérgio Godinho - Liberdade@Coliseu 2004" Sérgio Godinho TV: "Sérgio Godinho - Liberdade@Coliseu 2004"




Sérgio Godinho - Liberdade@Coliseu 2004
Sérgio Godinho TV



DR nº 78/2014 Ser. I - Artigo 7.º - Apresentação ao concurso interno e mobilidade interna

Decreto-Lei nº 60/2014 de 22-04-2014
-
Artigo 7.º - Apresentação ao concurso interno e mobilidade interna

      1 - Para efeitos de consolidação na vaga do quadro de zona pedagógica de colocação, de provimento noutro quadro de zona pedagógica ou em quadro de agrupamento ou de escola não agrupada, os docentes colocados ao abrigo do presente decreto-lei são obrigados a concorrer ao primeiro concurso interno a realizar nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho.
      2 - Na candidatura ao concurso interno os docentes concorrem em 4.ª prioridade, imediatamente seguinte à estabelecida na alínea c) do n.º 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho.
      3 - Até à realização do concurso interno, os docentes são obrigados a concorrer à mobilidade interna em 3.ª prioridade, imediatamente seguinte à estabelecida na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, sendo-lhes aplicado os números seguintes do mesmo artigo.
      4 - A violação do disposto nos números anteriores determina a anulação da colocação obtida nos termos do presente decreto-lei.


Enviado a partir de BDJUR* - Diário da República.

*BDJUR
Códigos, legislação e jurisprudência, actualizados diariamente e ainda um dicionário jurídico e formulários, com a qualidade Almedina.



Jorge Barbosa

DR nº 78/2014 Ser. I - Artigo 2.º - Requisitos de admissão

Decreto-Lei nº 60/2014 de 22-04-2014
-
Artigo 2.º - Requisitos de admissão

      Podem ser opositores ao concurso externo extraordinário os candidatos que reúnam, cumulativamente, os seguintes requisitos de admissão:

            a) Exercício efetivo de funções docentes com qualificação profissional em estabelecimentos públicos de educação pré-escolar ou dos ensinos básico e secundário, em pelo menos 365 dias, nos três anos letivos imediatamente anteriores ao da data de abertura do presente concurso, em regime de contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo;
            b) Preencher os requisitos previstos no artigo 22.º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, adiante designado abreviadamente por ECD;
            c) Ter obtido avaliação de desempenho com menção qualitativa não inferior a Bom, nos anos a que se refere a alínea a), desde que o tempo de serviço fosse obrigatoriamente avaliado nos termos da legislação ao tempo aplicável.


Enviado a partir de BDJUR* - Diário da República.

*BDJUR
Códigos, legislação e jurisprudência, actualizados diariamente e ainda um dicionário jurídico e formulários, com a qualidade Almedina.



Jorge Barbosa

DR nº 78/2014 Ser. I - Artigo 1.º - Objeto

Decreto-Lei nº 60/2014 de 22-04-2014
-
Artigo 1.º - Objeto

      1 - O presente decreto-lei estabelece um regime excecional destinado à seleção e recrutamento de pessoal docente para os estabelecimentos públicos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário na dependência do Ministério da Educação e Ciência.
      2 - O processo de seleção e recrutamento previsto no número anterior realiza-se mediante concurso externo extraordinário, nos termos estabelecidos no presente decreto-lei.


Enviado a partir de BDJUR* - Diário da República.

*BDJUR
Códigos, legislação e jurisprudência, actualizados diariamente e ainda um dicionário jurídico e formulários, com a qualidade Almedina.



Jorge Barbosa

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Mudanças e continuidades. A passagem da Idade Média à Moderna no espaço Ibérico

*  *  *
Publié le lundi 14 avril 2014 par Marie Pellen
RÉSUMÉ
O presente workshop tem por objectivo reunir jovens de diferentes nacionalidades, desde pós-doutorandos a investigadores cujas pesquisas já se encontram amadurecidas, para reflectir sobre processos históricos na longue durée.Este evento será o primeiro de um ciclo de workshops com uma periodicidade anual, que pretende discutir a temática geral em estudo partindo de diferentes enfoques.O workshop contará com a discussão de três grandes temas - Cultura-Religião, Economia-Comércio e Política-Diplomacia -, a partir dos quais se pretende realizar uma dupla leitura, consecutiva e interdisciplinar, sobre as mudanças e continuidades na passagem da Idade Média à Moderna no espaço Ibérico com o intuito de observar a ambiguidade e a indefinição das cronologias rígidas.
ANNONCE

Programa

10h00 Sessão de Abertura

  • Francisco Zamora Rodríguez(CHAM, FCSH/NOVA-UAç)
  • Francisco Díaz Marcilla (IEM, FCSH/NOVA)

10h15 Conferência Inaugural

Saberes no Portugal de Quinhentos. Entre sincretismo e inovação
  • Ana Isabel Buescu (CHAM, FCSH/NOVA-UAç)

11h45 A chave pontifícia: as raízes da mudança nos cabidos catedralícios ibéricos no trânsito à Idade Moderna

  • Antonio J. Díaz (CIDEHUS, UÉ)

12h15 Quanta Idade Média há na Moderna? mudanças e continuidades nas relações ibéricas Monarquia-Igreja

  • Francisco José Díaz Marcilla (IEM, FCSH/NOVA)

14h30 La ganadería castellana en un contexto de cambio de inserción en Europa

  • María Antonia Carmona Ruiz. Universidade de Sevilha

15h00 Islas Afortunadas, puerta a la fortuna: la mudanza económica hacia el Atlántico através de los territorios insulares ibéricos

  • Javier Luis Álvarez Santos (ULL e CHAM, FCSH/NOVA-UAç)

16h00 A evolução e mudança das tipologias consulares com o estabelecimento e a consolidação do Estado moderno

  • Francisco Zamora Rodríguez (CHAM, FCSH/NOVA-UAç)

16h30 Estratégias diplomáticas de Portugal nas relações com Inglaterra entre 1350 e 1500

  • Tiago Viúla de Faria (IEM, FCSH/NOVA)

17h00 De banderizos a cortesanos: la transformación de la cultura política de la nobleza del reino de Navarra entre la Edad Media y la Moderna

  • Fernando Chavarría Múgica (Universidade de Alcalá)

17h30 Debate

CATÉGORIES
LIEUX
  • Lisbonne, Portugal
DATES
  • lundi 26 mai 2014
FICHIERS ATTACHÉS
MOTS-CLÉS
  • Medieval, Early Modern History, changes
CONTACTS
  • Francisco Zamora Rodríguez
    courriel : fjzamorarodriguez [at] gmail [dot] com
  • Francisco Díaz Marcilla
    courriel : qmarcilla [at] yahoo [dot] com
URLS DE RÉFÉRENCE
SOURCE DE L'INFORMATION
  • Francisco Zamora Rodríguez
    courriel : fjzamorarodriguez [at] gmail [dot] com
POUR CITER CETTE ANNONCE
« Mudanças e continuidades. A passagem da Idade Média à Moderna no espaço Ibérico »,SéminaireCalenda, Publié le lundi 14 avril 2014, http://calenda.org/285167

Para Quem Puder Aproveitar uma Viagem a Paris e Participar num Encontro sobre Crítica da Arte Contemporânea

*  *  *
Publié le lundi 07 avril 2014 par Rémi Boivin
RÉSUMÉ
Ce colloque a pour intention de développer une réflexion sur les pratiques actuelles de la critique de l’art contemporain et le cas échéant ses nouveaux territoires. Qu’en est-il de la critique aujourd’hui ? À quoi et à qui sert-elle ? Quelles sont aujourd’hui les formes de la critique ? Décèle-t-on de nouveaux types de pratiques de la critique, de nouvelles fonctions, de nouveaux fonctionnements, des nouveaux formats, des nouvelles écritures du jugement ? Internet et les réseaux sociaux proposent un nouveau lieu de diffusion pour la critique d’art, quelles en sont les spécificités ? En filigrane de ce portrait de la critique de l’art contemporain – tant pragmatique que théorique et idéologique – se pose aussi la question des relations de dépendance et de pouvoir, d’instrumentalisation et de collaboration, au sein du monde de l’art.
ANNONCE

Argumentaire

Si la critique moderne a eu tendance à mettre à jour les caractéristiques formelles ou sémantiques des objets ou encore leurs effets sur le spectateur, c’est parce que ces œuvres étaient pensées et perçues comme autosuffisantes. Le refus par nombre d’œuvres contemporaines de se déployer comme des objets finis manifeste un doute à l’égard de cette autosuffisance. Les œuvres n’ont pas d’existence hors contexte. Qui plus est, elles se construisent collectivement à partir de regards multiples, d’activations et d‘interprétations croisées. Quelles sont les incidences de ces bouleversements sur la critique et sur son fonctionnement ?
Ce colloque a pour intention de développer une réflexion sur les pratiques actuelles de la critique de l’art contemporain et le cas échéant ses nouveaux territoires et de poser, en filigrane de ce portrait – tant pragmatique que théorique et idéologique – la question des relations de dépendance et de pouvoir, d’instrumentalisation et de collaboration, au sein du monde de l’art.
Ces questions se jouent sur différents terrains que ce colloque se propose d’explorer. Ces pistes de réflexion sont des suggestions. Elles restent ouvertes à toute autre proposition concernant le sujet proposé dès lors qu’elle interrogera les aspects actuels de la critique d’art :
1. Les nouveaux supports de la critique.
La question posée est particulièrement celle de la critique sur Internet : y aurait-il un « renouveau de la critique d'art » lié à la liberté d’expression permise par les blogs ? Ou comment les nouvelles technologies et les réseaux sociaux transforment la critique d'art ? Quelles sont les incidences de la multiplication de l’accès aux sources critiques ? Les nouvelles pratiques sont-elles plus démocratiques, plus participatives, plus spontanées ? Peuvent-elles revendiquer une indépendance institutionnelle ?
2. Les nouvelles fonctions de la critique.
Dépassant les catégories traditionnelles de critique de médiation (critique explicative, critique interprétative…) et de critique d’évaluation, on voit se développer une nouvelle fonction du critique qui joue un rôle d’accompagnateur de l’artiste au moment de l’élaboration de son œuvre, une critique qui ne se limite pas à commenter et à évaluer des propositions artistiques mais qui contribue à l’élaboration de ces propositions lors d’échanges avec les artistes au moment de la genèse de leur œuvre.
On peut penser aux cas des résidences proposées à des critiques pour accompagner des artistes eux-mêmes en résidence (ex. de Zones d'expérimentations. Astérides, Marseille/Montréal/Bâle, Les Chantiers, Brest...). Ces résidences croisées entre de jeunes artistes - encore en quête de reconnaissance institutionnelle - et de jeunes critiques semblent favoriser et confirmer la possibilité d’un rôle explicite du critique d'art dans la genèse des oeuvres. Dans quelle mesure ce type de critique favorise-t-il l’institutionnalisation du travail des artistes ? Et dans ce cas, qu’en est-il d’une éventuelle instrumentalisation de l’artiste et de son œuvre par le discours ?
3. Les nouveaux objets de la critique.
Ici, la question posée est particulièrement celle de la critique d’exposition : critique anti-moderniste dans la mesure où elle a pour préalable implicite la conviction que la critique des œuvres en tant que telles est un leurre, les œuvres d’art ne pouvant être considérées comme des entités closes. La critique d’exposition pose de multiples questions dont celle de la relation entre les œuvres exposées et les institutions exposantes ou celle de la valorisation du travail du commissaire par le critique d’exposition.
4. Les nouvelles figures du critique.
Une réflexion sur la critique contemporaine doit amener à penser les frontières entre le rôle du commissaire d'exposition et le rôle du critique d’art. Si la fonction de la critique est de construire la reconnaissance sociale de propositions artistiques, on est conduit à se dire que les curateurs sont les premiers à jouer ce rôle. Inversement, il y a des situations où le critique est amené à jouer un rôle de commissaire d’exposition (sélection, mise en valeur, contextualisation, diffusion). De la même manière, qu’en est-il de l’accueil des critiques d’art dans les institutions ? À l’arrière-plan de la superposition critique/commissaire, on peut se demander ce qu’il en est des possibilités d’une pratique professionnelle de la critique aujourd’hui. Les relations des critiques avec les acteurs du monde de l’art sont multiples, le partage des rôles est parfois difficile à identifier : le curateur, le commissaire d’exposition sont-ils devenus les « nouveaux critiques » ?
On peut également s’intéresser à la frontière entre le critique et l’artiste lui-même. Dès les années 60, certains artistes ont voulu prendre en main la littérature et les discours sur leur propre travail. Que reste-t-il aujourd’hui de cette pratique ? Et qu’en est-il de la forme très actuelle de conférence-performance pratiquée par certains artistes pour éclairer leur travail ?
5. Les nouvelles formes d’écriture
On pourra aussi interroger l’écriture critique contemporaine : style et lexique de la critique actuelle, formes récurrentes voire stéréotypées d’écriture, analyse des argumentations, réflexivité du texte critique peuvent être questionnés. D’autre part, une forme d’écriture critique empruntant un style littéraire semble faire sa réapparition, quels en sont les contours ?
Des formats brefs aux formats longs, les critiques – dès lors qu’elles sont destinées à l’édition papier (journaux, magazines, ouvrages scientifiques) – sont formatées en nombre de caractères. Quelles relations établir entre ces formats et les contenus des critiques ? Quelles sont les incidences du micro-blogging (Twitter) sur l'écriture de la critique ?

Modalités de soumission

Date limite d’envoi des propositions de communication : 1er juin 2014, par mail à Claire Fagnart : claire.fagnart@univ-paris8.fr  et à Nathalie Desmetnathalie.gm.desmet@gmail.com

La proposition de communication doit contenir un titre et un résumé de 2500 caractères maximum (en vue d’une communication d’une durée de 20 minutes environ) et une brève biographie.

Comité scientifique

  • Maxence Alcalde (Esadhar, Le Havre),
  • Laurence Corbel (Université Rennes 2),
  • Nathalie Desmet (Université Paris 8 Vincennes-Saint Denis),
  • Claire Fagnart (Université Paris 8 Vincennes-Saint Denis),
  • Isabelle Ginot (Université Paris 8 Vincennes-Saint Denis),
  • Jérôme Glicenstein (Université Paris 8 Vincennes-Saint Denis),
  • Isabelle Launay (Université Paris 8 Vincennes-Saint Denis),
  • Agnès Lontrade (Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne),
  • Paul-Louis Roubert (Université Paris 8 Vincennes-Saint Denis),
  • Emmanuel Wallon (Université Paris 10 Nanterre).
Ce colloque est soutenu par le Labex arts-H2H et bénéficie d’une aide de l’État gérée par l’ANR – Convention attributive d’aide ANR-10-LABX-80-01.

Indigência Intelectual ou Reforma do Estado?

REFORMA DO ESTADO:  a indigência intelectual no seu limite. O Estado não é o seu governo. Se o governo do Estado não se sente capaz de o governar não tem de reduzir as suas funções. Basta-lhe ser honesto e demitir-se para que quem seja capaz o faça. Há que distinguir Estado de administração do Estado. A administração do Estado precisa urgentemente de se reformar. O Estado também, mas não desta forma indigente e a raiar a parvoíce.


quinta-feira, 10 de abril de 2014

Pensar é Mais do que se Pensa

Todos os homens, desde o mais primitivo ao mais civilizado, fazem uso da sua mente ou do seu espírito, uma vez que todos o têm. Se pensar consistisse somente neste exercício do espírito ou da mente, teríamos de admitir que todos os homens pensam. Todos, com efeito, vivem num mundo de significados e de valores. O real não é para nenhum ser humano uma presença muda; é o correlato do seu desvendar, realizado pela língua que falam e pela cultura a que pertencem. O mesmo é dizer que todos procuram um sentido, todos comunicam significados e valores que estruturam a sua relação com o mundo e com os outros homens. Neste sentido, o homem é um ser pensante porque é um ser que fala. O pensamento não é monopólio de ninguém, é próprio da condição humana, mesmo nas suas condições patológicas, pois as palavras de um doente mental, por muito delirantes que sejam, não são completamente destituídas de sentido.
No entanto, não basta usar o espírito, através da palavra, para pensar verdadeiramente. A criança fala, mas, que se saiba, nenhuma criança é autor de uma obra filosófica; por outro lado, durante milénios muitos homens viveram sem saberem o que é que “pensar” quer dizer. É que há uma grande diferença entre o que se pode chamar o pensamento imediato (ou espontâneo) e o pensamento filosófico  ou pensamento muito simplesmente.
O pensamento imediato desenvolve-se sob o signo da passividade. O pensamento filosófico desenvolve-se sob o signo da atividade ou da ação humana. O primeiro corresponde à alienação dos domínios da mente e da moral, o outro corresponde à reapropriação desse domínio.
Com efeito, na medida em que aquilo que pensamos é a caixa de ressonância de representações construídas em nós pela educação que recebemos e pelo ambiente cultural a que pertencemos, é errado pretender que somos o sujeito ativo dos nossos pensamentos. Estes pensamentos são fabricados, independentemente da nossa iniciativa intelectual, por instâncias exteriores das quais somos um brinquedo inconsciente. Absorvemo-los com o leite materno e ao longo do nosso desenvolvimento pelo simples facto de estarmos imersos num contexto familiar, social, histórico, e por aprendermos a falar uma língua particular, pois nenhum língua é uma descodificação neutra da realidade. Todas analisam o real de acordo com interesses e com tradições, na situação singular deste ou daquele grupo.
Daqui segue-se que, na sua forma imediata, o pensamento é menos da ordem do pensado do que da ordem do não pensado. Funciona no interior de um sistema de representações que o influenciam, sem que tomemos consciência dessa influência, o que corresponde ao que podemos chamar determinismo ideológico. Deste modo, o pensamento é o porta-voz de significados que o aprisionam. Foram tão bem interiorizados que se solidificaram sob a forma de hábitos mentais que se impõem com uma tal evidência que se constituem em obstáculos internos à atividade pensante. Quer isto dizer que não pensamos como respiramos e que não basta dispormos de um espírito ou de uma mente para pensar verdadeiramente. O pensamento verdadeiro realiza-se sempre como pensamento do pensamento, isto é, como movimento de retorno ou de reflexão da mente sobre si mesma, de forma a submeter as suas produções a um exame racional. Atualiza-se, portanto, como reflexão crítica sobre o que até então era evidente. Marca o momento em que o sentido deixa de ser aceite como um significado recebido, para se transformar num significado problemático. Constitui, portanto, um ponto de ruptura entre um antes e um depois. Era a isto que Sócrates se referia ao dizer que a vida filosófica era uma espécie de segundo nascimento. E isto vale tanto para toda a humanidade como para cada homem particular.

O que é a Filosofia (excerto)
Jorge Barbosa, Setembro 2013

Escola que Protege

Escola Que Protege by JORGE BARBOSA

terça-feira, 8 de abril de 2014

Que Desgraça a Minha: Afinal, Serei Masoquista?

Que Desgraça a Minha: Afinal, Serei Masoquista?

Hoje pôs-se um dial lindo. Porque haveria eu de ter passado ontem à noite pela RTP1 à hora errada? Porque haveria eu de me confrontar com aquela coisa da educação especial? Terá sido o destino que me levou a passar por aquele canal na altura em que o meu amigo David Rodrigues estava quase a concluir a sua intervenção, e assim a convencer-me de que valeria a pena continuar no canal? Ou foi tudo má sina e enganos meus?
Não quero falar daquilo. 
Há, pelo menos, vinte anos que a conversa é aquela a que todos pudemos assistir na RTP1. Há, pelo menos, vinte anos que os pais, os administradores da educação e da segurança social, os profissionais de saúde, os académicos e os empresários da educação especial e do respetivo subsídio dizem a mesma coisa, ainda que com algumas palavras diferentes. A situação não evoluiu, muito menos beneficiou de algum progresso. Portanto, regrediu, por que o comboio continua em marcha, deixando as estações e apeadeiros em marcha atrás.
Há de facto muita emoção e muito juízo toldado neste assunto. Tirando estes fenómenos, alguns de puro egoísmo e sobranceria, não é os pais que devemos criticar. A maior parte deles não entende o que se passa. É natural que essa esmagadora maioria se enerve e se sinta profundamente desorientada. 
Aquilo que é condenável é que as suas queixas de ontem, dia 7 de abril 2014, tenham a mesma natureza das de há vinte anos atrás, pelo menos.
Aquilo que é condenável é que o governo português não tenha sido capaz de equacionar os problemas e de ter um plano para os ir superando de forma consistente, também se diz sustentada. Tem, pelo contrário, um grupo de trabalho para rever um Dec-Lei que, tendo resistido 10 vezes menos tempo do que aquele que veio substituir, nunca teve qualidade para se preservar mais do que um dia, gerando problemas como muitos daqueles que foram denunciados naquele programa de TV (deficiências permanentes e outros problemas… só para dar um exemplo).
Aquilo que é condenável é se esse grupo de trabalho não for capaz de inverter a decadência que o Dec-Lei, que está a ser revisto, gerou na Educação Especial e sobretudo no conceito e prática de uma educação inclusiva.
Aquilo que é condenável é que a representante da administração da educação ainda acredite na prioridade da afetação de recursos humanos para este ou aquele aluno e não diga, pelo menos (já que garantir não está nas suas mãos), que os recursos humanos das escolas são para todos os alunos e que a sua gestão eficiente (ou inclusiva) implica necessariamente uma outra organização da escola.
Aquilo que é condenável é que o subsídio de educação especial, um anacronismo com origem anterior ao 25 de Abril, ainda não tenha sido posto ao serviço de serviços afins à educação. Na verdade, esse subsídio tem origem em mecanismos de compensação da dispensa legal da escolaridade obrigatória. Inicialmente, só era atribuído a deficientes que fossem excluídos da escola regular, isto é, a quase todos. Algumas organizações de apoio a deficientes (associações de pais, na sua maioria) ainda nos finais do século XX promoviam formas subtis de exclusão escolar para aceder a esse subsídio sem dificuldades burocráticas. As instituições que, após o 25 de abril de 1974, se assumiram como promotoras da educação de crianças com deficiência, também encontraram nesse subsídio de educação especial uma das suas principais fontes de financiamento, contrariando de forma inequívoca os fundamentos da sua origem, entretanto obviamente corrigida. A confusão estava lançada: um subsídio à exclusão da frequência da escola estava a financiar a frequência de escolas especiais, tuteladas pelo ministério da educação, em contraponto com centros educativos tutelados pela segurança social. Quando, para resolver esta bagunça, o governo de Guterres decide que todas os estabelecimentos de educação, frequentados por alunos com deficiência, passavam a ter a tutela do ministério da educação e a beneficiar do seu financiamento, através do OGE, passou a sobrar um montante muito significativo de contribuições que a Segurança Social não sabia a quem atribuir, sendo certo que, fazendo parte dos regimes contributivos,  não podia ser utilizado para outro fim que não fosse o de subsidiar as famílias. A visão, o empreendedorismo, a inovação de alguns técnicos não demoraram a propor soluções para financiamento das sua atividades através desse dinheiro repentinamente disponível em grande uantidade. Abriu-se a caixa de Pandora. Muitas dessas iniciativas eram honestas e meritórias. Mas não estavam em sintonia com a legalidade do subsídio de educação especial. Este subsídio destinava-se e destina-se a financiar estabelecimentos de educação e professores especializados. O facto de, para despachar esses subsídios, se alargar o conceito de estabelecimentos de educação a empresas menos regulamentadas na sua atividade do que aviários (nem sequer eram regulamentadas), e o conceito de professores especializados a terapeutas, psicólogos e o mais que a imaginação pudesse angariar, gerou mais injustiça do que justiça. Há cerca de 15 anos, pelo menos, que se anda em busca de um procedimento uniformizado no país. Simplesmente, não é possível porque a abertura dos conceitos é muito mais compatível com a discricionaridade do que com o que possa estar certo ou errado: na verdade, nada está certo, o que facilita hipocritamente os cortes, em nome de procedimentos normalizadores, mas não clarifica direitos nem deveres. 
Compreendo a revolta dos pais. Não aceito a hipocrisia das empresas de educação especial. Nem aceito a incompetência da administração e do governo que não consegue resolver um problema com barbas que, para já, só requer regulamentação das organizações de técnicos de apoio às escolas e critérios de financiamento. Essa regulamentação não pode, não deve, manter ou alimentar a confusão entre técnicos de apoio às escolas com técnicos de complemento do Serviço Nacional de Saúde,  isto é, paramédicos cuja intervenção depende de diagnóstico e prescrições médicas (mas não de pediatras ou psiquiatras, por exemplo, a receitar fisioterapia em vez dos fisiatras). Essas empresas podem mesmo instituir-se como clínicas devidamente legalizadas pelos serviços de saúde. O que não podem, nem devem, é viver à sombra desta bagunça e não lutar, não propor a sua própria regulamentação, a sua legalização para defesa da qualidade da sua própria atividade, que muitas dessas empresas têm seguramente. Entretanto, seria dramático que, enquanto este processo de regulamentação esteja a ser negociado, sejam cortados os subsídios. Essa seria a forma mais cretina de estragar tudo. Esta pessegada dura já há tantos anos, que não seria problema, só para assegurar a manutenção (até ver) do dinheiro disponível, que se mantivesse durante mais dois ou três meses. A organização e a gestão de recursos disponíveis devem estar ao serviço de ideias claras e vantajosas para as crianças com deficiência.
Só que o problema é bem mais sério. Ao nível da educação, há pouco que possa ser feito por essas crianças que não passe por uma organização eficiente da escola. E o problema é que estamos cada vez mais distantes disso.

Embora não tenha sido apanhado completamente desprevenido, fiquei triste. Chorar alivia, mas não soluciona. Em todo o caso, deixo aqui uma lágrima para lavar o passado, e uma outra para lavar o futuro, como é habitual acontecer-me com os pingos de chuva.
Vou mesmo evitar dizer tudo o que penso sobre este assunto. Vou, por uma vez, ser moderado e não falar, por exemplo, de incompetência, promiscuidade, etc.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

25 de Abril - A Revolução da Classe Média

Um fenómeno interessante e clarificador está há já algum tempo a manifestar-se em Portugal.
O 25 de Abril correspondeu a uma alteração de regime político, suportada por uma classe média culta que apostava, apesar de detentora de recursos financeiros variáveis, na educação, universitária de preferência, dos seus filhos. O verão quente de 1975 não obteve apoio popular porque o apoio à revolução era assegurada por essa pequena burguesia que queria paz e condições de segurança para si e para o país. Era este o seu conceito básico de desenvolvimento.
Representantes públicos (músicos e outros artistas, sobretudo) desta pequena burguesia esclarecida e patriótica, como diria o MRPP na altura, aparecem agora a manifestar o seu desencanto. Há até quem emigre por isso. A narrativa destas figuras públicas de reconhecido e merecido mérito orienta-se para uma auto-justificação desnecessária, mas compreensível: eles não eram indigentes, o pai era médico, a mãe era doméstica mas sabia tocar piano e tinha uma enorme sensibilidade artística, tal como os avós e por aí fora. Se o seu estilo de vida e as suas preocupações artísticas os afastavam dessa pequena burguesia, a verdade é que dependiam dela para viver com qualidade.
Agora, estão preocupados com a situação do país. Não foi para que um governo, manifestamente muito mal formado do ponto de vista académico, se dedicasse a destruir a classe média que foram tão generosos na sua juventude.

Acontece que aqueles que não foram socialmente promovidos pelo 25 de Abril e que se mantêm em condições de vida miseráveis também não têm nada a agradecer ao regime democrático.

Esta combinação de desencantados é muito mais potencialmente revolucionária do que a pobreza de espírito do governo de ditadura anterio a 1974. Só falta uma guerra colonial. Talvez não falte, só que seria suposto que os colonizados não fossem os portugueses.

Futuro e Imprevisibilidade


O futuro e a imprevisibilidade são uma e a mesma coisa. Não me atrevo a dar-lhes o nome de sinónimos, só porque, tendo lido algumas coisas sobre a nova gramática da língua portuguesa, decidi desistir do esforço de compreender por que razão, na filosofia tanto como agora na linguística, os movimentos de formalização da linguagem precisam tanto de a afastar da língua natural, para a submeter ao domínio do digital binomial. Essas razões, afinal, não estarão muito longe daquelas que subordinam a política às finanças.
Também não é preciso distinguir o futuro da imprevisibilidade. De facto, se o futuro não fosse imprevisível, não existiria. Simples.
A humanidade inventou as narrativas míticas e a própria ciência para combater essa imprevisibilidade, para destruir o futuro, para colocar tudo no presente, para viver no paraíso ou no nirvana. Não conseguiu (inconseguimento?).
O mais complicado é que o próprio passado é uma interpretação que depende, ela, a interpretação, da imprevisibilidade do futuro. O passado também é imprevisível. Interpretá-lo implica que tenhamos alguma perspetiva sobre o que poderá vir a ser o futuro.
O que é que nos resta? Justamente a linguagem humana e o pensamento para dar sentido ao mundo. Seria aconselhável que aqueles a quem foi atribuído o privilégio de falar assiduamente com o povo não destruíssem este pouco que nos resta de humanidade.