quarta-feira, 11 de julho de 2012

Há quem pense e há parolos a cuspir para o ar

A Conferência Social, debate aberto entre governo, federações sindicais e federações patronais, promovida pelo Governo francês saldou-se num quase sucesso total. Por exemplo, as confederações sindicais da linha da UGT e da CGTP portuguesas congratulam-se publicamente com os resultados.
Os partidos da direita e muitos "comentadores políticos" discordam ou receiam que as medidas preconizadas sejam postas em prática.
Uma, já a incluir no orçamento de 2013, merece uma particular atenção, porque a França é o primeiro país da Europa do Sul que tem a coragem de dar um primeiro passo de ruptura com a tradição que associa a segurança social ao conceito de caixas de previdência.
Com efeito a Segurança Social (na sua vertente específica de segurança social propriamente dita, de educação e de saúde) é a razão central que justifica a existência do Estado. Sem Segurança Social (incluindo no conceito a Educação e a Saúde), o Estado é um Estado opressor, e só isso.
Em que consiste essa medida?
Em primeiro lugar, visa a redução substancial dos custos do trabalho (cerca de 5-6% da taxa de desconto para a Segurança Social).
Em segundo lugar, é criada uma nova Contribuição Social Geral que, incidindo sobre todos os rendimentos, compensa essa redução dos impostos sobre o trabalho. Por outras palavras, todos os rendimentos serão taxados para financiar a segurança social, isto é, a função central do Estado. Sendo essa contribuição do tipo do IRS, os trabalhadores com menores rendimentos e todas as empresas ficarão a ganhar (a nova contribuição será de montante inferior ao desconto para a Segurança Social, e as empresas não pagarão sequer essa nova contribuição); por seu turno, os rendimentos mais elevados, os rendimentos de capital e outros não resultantes do trabalho vão ficar a perder.
Chama-se a isto valorizar o trabalho e aumentar a competitividade das empresas, sem ser pela via da redução dos salários.
Agora, já compreendo por que razão o governo francês antecipou uma parte do aumento do salário mínimo, previsto para 2013, já para Julho de 2012.
E sobretudo compreendo como é que, de um momento para o outro, a França, que estava na calha para ser pressionada, como a Espanha e a Itália, com taxas de juro especulativas, começa agora a receber dinheiro emprestado (e não é pouco) com juros negativos: quando tiverem de devolver o dinheiro que pediram emprestado, os franceses vão devolver menos do que o que receberam. As políticas recessivas do governo anterior estavam a provocar exactamente o contrário.
Esta é uma primeira medida. Nem sei se é completamente correcta. Mas vai no sentido certo: no de identificar o financiamento da função central do Estado com todos os beneficiários do bem comum, da vida em sociedade organizada, e não somente o trabalho e as empresas.
Os países do Norte da Europa já fizeram essa mudança radical há muito tempo, e talvez por isso sejam mais poupados à especulação, e também consigam pagar melhores salários.
Saúdo este enquadramento político (finalmente) da crise do Estado, ainda que não tenha a certeza sobre se esta medida não deveria ser ainda mais radical.

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