quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Escrevida III de CHAPLIN - Excertos de Entrevista


  1. "Imagina, Chaplin, uma nova espécie animal tão sapiens como outra qualquer, mas não homo, uma felinus sapiens, por exemplo. Aprenderia sem dificuldade que um homo sapiens qualquer já tinha pisado a Lua. Em abono do facto, teria acesso a imagens gravadas, atestando esse fenómeno com toda a evidência e contra todo o ceticismo. O problema, Chaplin, surgiria quando imagens e provas da mesma qualidade, ou até de qualidade muito superior, mostrassem cavalos a falar, homens a zurrar, e por aí fora. O que seria a verdade num mundo destes? É que essas imagens e provas, para um qualquer felinus sapiens, existem por aí aos montes."
  2. "Como podes tu, pobre Chaplin, distinguir um programa de televisão de um intervalo publicitário? Não podes, ninguém pode, porque os programas destinam-se a mostrar, não o que é bom, mas o que, se não for mostrado, não será nada".
  3. "Ouviste aquele treinador de futebol a garantir que, depois de um jogo sem a equipa fazer um único remate à baliza do aversário, fazer um novo jogo e rematar duas vezes e fazer um golo já é um grande progresso?"
  4. "Observa bem aquela velha a roer o farrapo de couve galega, a enrolá-lo no único dente que ainda tem, a misturá-lo na broa de milho que mastiga laboriosamente, a saborear uma verdadeira iguaria, e a lamentar-se de não ter contado à sua filha que há muito já fez setenta anos, e que agora lhe pede desesperadamente que a salve da máquina que lhe vai desvendar os interiores, que aqueles homens, que nascem de geração espontânea do monte de lixo que separa a sua rua da rua dos outros, são boas pessoas, mas não servem para pais dos filhos das mulheres. Diz-lhe isto, com a filha sentada ao colo. Mas sabe que não resolve nada com o que diga. Porque tudo o que possa dizer já é tardio e fora do prazo."

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