Sou mais velho do que o Sr. Ministro da Educação. Tenho muito mais experiência de professor de ensino secundário do que ele, embora menos de ensino superior. A minha formação académica é diferente, mas não é, no respeito pelas diferenças inevitáveis, inferior, e inclui uma Universidade Francesa, uma Universidade Portuguesa, e um Laboratório de Investigação Científica na Universidade francesa (na qualidade de bolseiro do Governo Francês). Só esclareço este assunto, de forma muito sumária, porque a minha única intenção é ser-lhe de alguma utilidade como conselheiro, que ouvirá ou a que ligará, se muito bem lhe apetecer, mas não de vítima do seu egocentrismo ou de subserviência às suas crenças e conceitos de uso privado (a que deveria ter o cuidado de só recorrer em sítios próprios).
Não vou comentar os disparates que disse e diz do ponto de vista de ciências, para as quais visivelmente não tem formação académica suficiente (ninguém é omnisciente, e ele também não - o que há, até em exagero, é gente presunçosa). Só pretendo mesmo esclarecer algumas coisas que ele insiste em apagar a luz que lhe resta, como em todas as outras pessoas, para não ver ou para falar sem se ver ao espelho.
Na entrevista que deu na RTP1 equacionou bem, numa certa perspetiva perfeitamente razoável, que sendo uma opção política assumida tem a legitimidade democrática a sustentá-la, não a verdade científica, ao contrário do que a sua postura indicia. Não há que recear a ideologia. Aquilo que há a recear é a alienação, que começa no justo instante em que um ideólogo se considera a si mesmo competente por razões não ideológicas, científicas, por exemplo.
Também concordo que o acesso à formação de professores deve ser cuidadosamente revisto. Mas, sendo esta uma questão muito complexa e não dependente exclusivamente de medidas do ministro da educação, é desaconselhável introduzir fatores de instabilidade, de insegurança e de respeito muito hipócrita no acesso à profissão. Até, neste momento, uma criança de Jardim de Infância já percebeu que há profissões, que, pelo sucesso que garantem no acesso a uma vida digna dos seus profissionais, se tornam muito seletivas no acesso à formação. O senhor ministro introduz exames seletivos obrigatórios, mas destrói com muito zelo os fatores que o ajudariam a ele e a todos nós a colocar a profissão docente num nível de dignidade seletiva, sem ofensa (pelo menos aparente ou deliberada) para ninguém.
Também concordo com as críticas que faz ao sistema de formação profissional de docentes. Neste caso, talvez eu seja ainda mais crítico do que ele. Ele é mais novo do que eu e talvez não saiba certas coisas. Vamos esclarecer o assunto. Um governo de esquerda, o de Lurdes Pintassilgo, tinha introduzido um sistema de profissionalização, de acesso à carreira docente, muito, mas mesmo muito mais exigente do que um simulacro de exame com perguntas de escolha múltipla. Prolongava-se por dois anos e implicava um tempo de formação para o professor em estágio que o colocava numa situação real de docência numa escola real, sob supervisão permanente. A primeira coisa que o governo de Cavaco fez foi destruir este sistema, penalizar a carreira diplomática de Lurdes Pintassilgo, e introduzir um sistema de profissionalização que corresponde a um plano inclinado, onde a velocidade da decadência é uniformemente acelerada. Já caiu há muito tempo em terra firme, estando agora a fazer exploração subterrânea.
Outras coisas que disse, não vou comentar, porque, de facto, convictamente, só quero ajudar.
Qual é a ajuda afinal que está na minha mente? Pois bem, só quero aconselhá-lo a que tendo equacionado um problema, se atreva a encontrar a solução para ele e não para outra coisa qualquer que não é enunciado como problema (deformação de quem trabalhou num laboratório de investigação experimental). Por exemplo, se é preciso rever urgentemente as condições de acesso à profissão, então que se negoceiem e corrijam aquelas que, no formato de imposição legal, estão em vigor. O mesmo se diga a respeito de qualquer outra equação. Que a solução não seja simplesmente outra nova equação, neste caso inadequada, posterior ao reconhecimento legal de acesso. Rever o acesso à profissão não é manter o sistema de acesso à profissão, e, depois de ele se ter consumado, estabelecer um mecanismo de controlo que é abusivo, ou que só não seria, se não houvesse um processo legal, socialmente aceite, de acesso prévio.
Não vou alongar-me, para evitar ser menos polido.
Fica só o conselho global, para que o senhor ministro da educação não desate a correr pelo campo de jogo para marcar golo, e quando está à frente da baliza aberta já nem sabe o que lá foi fazer. Pega na bola com a mão e põe-se a protestar contra a incompreensão de pessoas que o senhor só consegue imaginar com a luz apagada.
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