Não resisto, dadas as circunstâncias, a transcrever mais um excerto do meu trabalho de análise do pensamento de Espinosa (séc. XVII). Que vos faça bom proveito.
"(...) devemos recordar que uma cidade, embora tenha o direito de fazer tudo aquilo que pode fazer, não tem mais direito do que o que ela pode efetivamente ter. Ora, ela não pode tudo: o seu direito é, portanto, limitado. O segundo argumento de Espinosa analisa essa limitação interna do poder público (§ 8, IV, pp. 28-29). A cidade retira o seu poder, ou da dissuasão pelas ameaças que faz, ou da persuasão pelas recompensas que promete. Por conseguinte, tudo o que ela possa querer impor, mas que seja considerado pelos homens ainda pior do que a pior das ameaças possíveis, está na realidade fora do seu poder. Do mesmo modo, ela não pode exigir de nenhum homem sensato um acto que não traga nenhum benefício futuro que possa compensar o mal. O poder político encontra, assim, o seu limite em si mesmo, quando atinge o seu máximo, e não porque tem de fazer face a um outro direito com o qual tem de se operar uma transacção jurídica. Só desta forma, pensa Espinosa, é garantida a faculdade individual de julgar; na verdade, essa faculdade individual de julgar não tem de ser garantida por nada, porque se encontra fora do alcance do poder político. A “liberdade de pensar” não tem que ser defendida dos abusos que a poderiam ameaçar, pois nenhum ser no mundo, indivíduo ou cidade, consegue “abusar” do seu direito: só consegue imaginar que tem mais poder do que o que realmente tem."
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