sábado, 11 de julho de 2009

O ANALISTA


Um cientista decidiu investigar por que razão a água apaga o fogo. Formado na melhor tradição científica, o nosso homem empreendeu uma nova e sofisticada análise dos componentes da água. Fez análises atrás de análises e descobriu que, sem qualquer margem para dúvida, a água era constituída por hidrogénio e oxigénio. Embora este fosse um facto já conhecido, o nosso cientista garantiu que, pela primeira vez, ele tinha ficado comprovado de forma absolutamente convincente. Ganhou um prémio Nobel por isso.
Com o dinheiro do prémio, dedicou-se a investigar o papel que o hidrogénio e o oxigénio tinham no complexo fenómeno, observado desde a mais recuada antiguidade, que consistia precisamente na capacidade, que tem a água, de apagar o fogo. E descobriu que o hidrogénio ardia e que o oxigénio alimentava a combustão. Como podiam uma coisa que arde e outra que alimenta o vigor da chama apagar o fogo? Desistiu.
Dedicou-se, então à poesia. E perguntou: de que se compõe a paixão? Descobriu que os componentes da paixão são o amor (que arde sem se ver) e o sexo (que se vê mesmo que não arda). Ganhou um prémio literário.
Com o dinheiro deste novo prémio, dedicou-se então a investigar que produto poderia ser criado com combinações variáveis de amor e sexo. Descobriu que, numa certa combinação, o amor e o sexo destroem a paixão.
Se, no caso da água, os seus componentes deveriam transformá-la em gasolina, no caso da paixão, os seus componentes tranformavam-na em menos do que vapor de água.
Não tendo encontrado solução para os seus mistérios, o nosso cientista dedicou-se a defender o seu método, o único capaz de conduzir a humanidade à sabedoria: a análise.
Desde então, tudo quanto se produz é produto da análise.
Os analistas são o futuro da humanidade, pensou ele.
Há, todavia, quem pense que os pragmáticos um dia mostrarão o quanto valem. E nessa altura, os analistas e comentadores analíticos serão uma espécie em vias de extinção.
Os pragmáticos são, salvaguardadas as devidas diferenças de tamanho, de constituição física e anatómica, como os macacos em jaulas: vivem permanentemente fora de si, algures pendurados nas grades que os aprisionam.
Se os analistas não forem o futuro da humanidade, os pragmáticos sê-lo-ão, com certeza.
Estamos, portanto, salvos e, connosco, o futuro dos nossos netos e bisnetos.

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