É difícil compreender o conceito de "liberalismo". Se, por um lado, significa a subordinação dos princípios de organização social ao respeito pela liberdade individual, por outro lado, poucos são os liberais que defendem essa liberdade individual, ao nível dos costumes privados (eutanásia, descriminalização do aborto, consumo de drogas, etc.). Defendem a liberdade individual para os negócios públicos, o que, sendo contraditório, é como é. Os anti liberais pretendem que o Estado regule os negócios públicos, mas são liberais no que diz respeito aos costumes individuais. Na prática, portanto, não há um liberalismo puro, se nos limitarmos às ideologias dos partidos conhecidos. O libertarismo de Nozick está demasiado próximo da anarquia, para que possa seduzir por completo os liberais que querem viver da sua ligação à estrutura partidária. Preservam desse libertarismo só o conceito de Estado mínimo e de "livre mercado".
Eu acredito que a organização social deve subordinar-se ao conceito de justiça social, o que pressupõe a liberdade individual obviamente, mas não se reduz a ela.
Em todo o caso, o que surpreende nos liberais portugueses, actualmente no poder, é a sua tendência anarquista.
Os governos liberais da Europa defendem a liberalização do despedimento individual. Mas fazem-no, porque acreditam no mercado, e, portanto, não reduzem o valor das compensações financeiras, a atribuir aos trabalhadores desempregados. Na verdade, exigem que a empresa, ou os seus gestores, avalie as relações de custo-benefício no despedimento individual, para que não resulte simplesmente de uma noite mal dormida. Não concordo com esta estratégia liberal, porque, como disse, a justiça social deve prevalecer, nos negócios públicos, sobre o exercício da liberdade individual. Por outras palavras, ninguém deveria ter o direito de usar a sua liberdade para ser socialmente injusto. Mas compreendo a ideia: despedir é uma estratégia económica, que se fundamenta em opções de gestão, e não na arbitrariedade da empresa. Portanto, para despedir é preciso compensar.
O governo português liberaliza o despedimento individual e reduz as compensações por despedimento. Isto não é liberalismo; isto é estupidez. Para o governo português, despedir não tem de ser uma decisão de gestão; pode ser quase completamente arbitrária. Por conseguinte, reduz as compensações por despedimento individual (sem justa causa).
Einstein dizia que a loucura é insistir teimosamente numa solução que não resolve o problema. Esta é também uma das definições mais claras de neurose. Pode ser que não seja estupidez aquilo que leva um governo a persistir em soluções, que já se mostraram ineficientes, para a Educação e outros sectores, ou que insiste na ideia de que liberalizar é o mesmo que legitimar e promover o poder dos mais fortes. De facto, pode mesmo ser uma forma perigosa de neurose, que alimenta uma fé doentia em algo que só o neurótico sabe o que é.
Por mim, preferia que o governo de Portugal não fosse tão imberbe.
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