Quem for a http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT e pesquisar por educação especial, encontra a encimar toda a informação este discurso de 2004. SEM COMENTÁRIOS... Pense-se só no "debate" que precedeu a publicação do novíssimo, de Setembro de 2007, dec-Lei sobre Educação especial; pense-se nos conceitos que nele estão presentes; E conseguir-se-á compreender como é que foi possível publicar um Dec-Lei tão ocioso e tão pernicioso, como o actual. Ocioso, porque nada propõe que não pudesse ser feito ao abrigo do anterior; pernicioso, porque selecciona os erros praticados ao abrigo do anterior e legaliza-os. Brilhante: o que era erro, deixa de o ser por via da sua legalização. Brilhante mesmo.
A novidade, a única, é o alargamento da obrigatoriedade de aceitação dos alunos com NEE às escolas privadas. Mas não se define quem paga os custos acrescidos da educação especial... Serão os pais? Serão os pais a pagar o ordenado dos professores de apoio? Ou serão as escolas?
A confusão que sempre provocou a algumas estruturas do ME o facto de recursos das escolas públicas serem afectos para apoio a alunos de escolas privadas, vai agora desaparecer, ou a cegueira da ministra vai permitir que essas estruturas, com muitas confusões, continuem a mandar nela?
Veja-se então a primeira referência que surge quando se pesquisa no Portal do Governo por "educação especial":
Encerramento da discussão pública do Ante-Projecto de Decreto-Lei sobre Educação Especial e Apoio Sócio-Educativo
2004-02-14
Discurso da Secretária de Estado da Educação no encerramento da discussão pública do Ante-Projecto de Decreto-Lei sobre Educação Especial e Apoio Sócio-Educativo, na Torre do Tombo, em Lisboa
Minhas senhoras e meus senhores,
Antes de mais é importante reforçar o nosso agradecimento a quantos, por solicitação nossa ou até de modo espontâneo, permitiram a construção deste projecto de diploma. Num momento em que o país reorienta a sua estratégia nacional para um reposicionamento que é fundamental enquanto parceiro de uma Europa cada vez mais competitiva, a educação assume-se como o pilar estruturante de uma nova sociedade que responsabiliza todos e cada um pelo que deve ser o seu desempenho enquanto contributo para o Portugal em que acreditamos e que, segundo nós, não pode perder mais tempo. Neste contexto, a educação deve ganhar em abrangência, mas também em eficácia através de um pragmatismo mais consistente e mais consciente. O empenhamento e a convicção de todos os que, de uma forma ou de outra, acreditaram neste projecto, são assim, indissociáveis da sua concretização.
Minhas senhoras e meus senhores,
Foi assim que, após longos meses de trabalho articulado entre nós e com os nossos serviços, através de visitas, da realização de inúmeras reuniões, de reflexões em grupos mais ou menos alargados, chegámos ao projecto de diploma legal que está em discussão pública e estamos hoje em condições de afirmar que os contributos recebidos ao longo desta fase, têm sido todos eles objecto de avaliação cuidada, e neste momento é evidente para nós, não só a necessidade de incorporar algumas sugestões, como a de reformular alguns aspectos que, apesar do longo percurso para aqui chegar, acreditamos que podem ser melhorados. A prova disso é o amadurecimento constante de ideias que ao longo deste tempo, tem permitido a certeza de que este será um diploma dinâmico e passível de adaptações a uma realidade em constante evolução. A enorme pertinência das reflexões recebidas, reveladoras de um conhecimento/experiência fundamental para a percepção desta problemática constituíram uma mais valia para as opções teóricas e doutrinárias subjacentes a este diploma.
Senhoras e senhores,
O conceito de educação especial tem tido subjacentes noções de diferença, dependência e protecção. Ligado a um mundo representacional, o conceito de "normal" institucionaliza as diferenças e "arruma" a sociedade de maneira que o mosaico das dissemelhanças possa permitir a sua identificação. Hierarquizar os níveis de diferenciação, catalogar as suas tipologias, são formas que conferem ao mosaico referido uma espécie de coerência que conforta a boa consciência da sociedade. Não é essa a sociedade que queremos, no entanto não é um dado novo que as diferenças são irrefutáveis e assumi-las é o único caminho para lhes dar resposta.
O DL 319/91, de 23 de Agosto, representou nesta perspectiva um significativo avanço para uma abordagem da problematização da diversidade não só mais objectiva, como, essencialmente, mais susceptível de responder às questões suscitadas pela mesma diversidade/heterogeneidade.
Passada mais de uma década sobre o DL referenciado constatou-se a sua desadequação às necessidades que o justificaram. A modernização e o progresso da sociedade portuguesa trouxeram consigo uma série de novas problemáticas pelos novos consumos, pela urbanização apelativa e mal controlada, pelos desequilíbrios internos de um país que, a espaços, parece ter-se perdido de si próprio.
Materializadas em problemas sociais, estas problemáticas traduzem-se num decréscimo da solidariedade interna, num individualismo exacerbado pelos modelos vendidos todos os dias para suportarem um crescimento que carece de sustentabilidade. E que se traduzem, inevitavelmente, em dificuldades de integração para aqueles que, dados os desequilíbrios referidos, apenas permitem para alguns a sobrevivência, num ritmo que não é o seu. A estas questões o Decreto-Lei 319 não respondia de forma eficaz. E ao nível da aplicação deste diploma, os problemas da educação agudizaram-se porque as dificuldades criadas no âmbito das aprendizagens se avolumaram e acabaram por absorver os recursos que, no plano da filosofia do mesmo 319, tinham como destinatária a educação especial.
Em consequência de uma adequação que o tempo e a evolução sintetizada gastaram, do desajustamento relativamente a características implícitas no desafio da nova realidade social, surgiu a necessidade de tornar mais efectivos objectivos como a igualdade de oportunidades ou a integração, com vista a uma maior coesão social, que enquadrou uma nova leitura da articulação entre as necessidades e as respostas às mesmas.
O programa do XV Governo Constitucional prevê alterações que exigem medidas estruturais adaptadas às necessidades da nova realidade portuguesa. Destacamos apenas:
O reforço da igualdade de oportunidades de forma sustentável;
O reforço da solidariedade relativamente àqueles que verdadeiramente precisam;
O combate às assimetrias sociais e regionais;
A implementação de planos de integração das minorias;
A promoção do desenvolvimento humano e da afirmação de cidadania;
A assunção da reciprocidade de responsabilidades pela escola e pela sociedade relativamente aos problemas sociais, por serem as que, de modo mais imediato e visível, se articulam com a filosofia do diploma hoje em análise.
As orientações internacionais, designadamente as contidas na Declaração de Salamanca, em resoluções do Parlamento Europeu e Organização das Nações Unidas e emanadas pela Agência Europeia para o Desenvolvimento em Necessidades Educativas Especiais, revelam a partilha de uma mesma filosofia e enquadram, nesse sentido, alterações que traduzem as preocupações que nortearam a nossa estratégia para o país e, no caso vertente, para a educação. Destas destacamos, pela sua pertinência e oportunidade:
A multidisciplinariedade de abordagens;
A utilização das TIC para minorar as desigualdades;
A monitorização e avaliação constantes no sistema educativo;
O reconhecimento de que cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias;
O apoio a uma cidadania activa, único caminho para cada um individualmente, participar por si e pelos outros na concretização da igualdade de oportunidades que é factor de uma verdadeira coesão social.
A Estratégia de Lisboa aduz a necessidade de assegurar aos mais desfavorecidas e àqueles que actualmente menos beneficiam dos sistemas educativo e formativo, um acesso equitativo à aquisição de competências e motivando-os para participar na aprendizagem;
Minhas senhoras e meus senhores,
Tendo presentes os princípios e orientações referenciados, construímos o diploma, cuja versão última será o fruto da motivação e da reflexão critica daqueles que, quiseram partilhar connosco este desafio.
Neste sentido, procurámos concentrar no mesmo diploma os dispositivos legais que estavam até agora dispersos;
Promovemos um modelo de escola inclusiva orientado para o sucesso educativo de todas as crianças, que permite responder à diversidade de características e necessidades de cada um. «Adoptar como matéria de lei ou como politica o princípio da educação inclusiva, admitindo todas as crianças nas escolas regulares a não ser que haja razoes que obriguem a proceder de outro modo», é o momento da declaração de Salamanca, que nos reforça a confiança de poder afirmar que a escola deve ser espaço privilegiado de inclusão até ao limite da sua eficácia.
Neste contexto, reconhecemos e redesenhámos as unidades especializadas, que se constituem como unidades de referência integradas nos estabelecimentos de educação e se destinam a disponibilizar competências e recursos para a educação especial.
Clarificámos alguns conceitos estruturantes desta problemática e redefinimos a politica de inclusão;
Valorizámos a vivência da interculturalidade, pelo direito de todos à educação à igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativos, independentemente das condições sociais e linguísticas.
Pretendemos incentivar a participação dos pais e encarregados de educação no processo educativo com vista a uma maior eficácia e partilha de responsabilidades.
Optámos por uma abordagem centrada na criança ou jovem; assumindo a singularidade de cada caso e uma lógica consequente de adequação das respostas educativas, que nos permite construir um plano educativo individual que é condição de um plano de transição para a vida adulta.
Do mesmo modo, os alunos que revelem excepcionais capacidades de aprendizagem e um elevado grau de maturidade, encontram neste diploma uma resposta educativa específica, que não limite o seu desenvolvimento, antes potenciando o seu talento individual.
Salienta-se por fim, que a identificação e uma correcta avaliação das necessidades contribuem para fazer deste documento um marco decisivo na estratégia global que nos propusemos, de combate ao insucesso e ao abandono escolar;
Pelo seu conteúdo e pela metodologia de trabalho que entendemos seguir, pelo facto de nos momentos - chave da reflexão alargada termos mostrado a nossa disponibilidade, pela participação nos debates, acreditamos que, como nós encaram este diploma como um compromisso.
Para com o País; para com a sociedade, que não pode, em definitivo, deixar de se afirmar sistematicamente na sua vocação integradora; para todos aqueles que, por factores intrínsecos ou por causas exógenas, têm o direito de exigir uma solidariedade efectiva; para com o futuro, independentemente dos recursos de cada um ou do lugar em que tenha que viver.
Cabe aqui alguma reflexão em torno do país que temos, do país que somos, do que temos vindo a fazer da nossa democracia e da nossa liberdade.
É oportuno reequacionar os valores que são suporte de um projecto para a educação que se quer de todos e para todos. O trabalho e a disciplina, o rigor e a exigência, não podem ser ensinados; aprendem-se, ao longo de um processo de socialização do qual a escola é apenas um dos primeiros agentes.
É fundamental ter a coragem de repensas a realidade assimétrica que somos.
Sem descentralizar competências e recursos de forma claramente assumida, não vale a pena falar de fixação das populações onde quer que seja; sem, de forma deliberada, se adoptar uma política real de discriminação positiva, mesmo a educação especial dificilmente será um factor de diluição das assimetrias sociais e regionais.
Desportos individuais adaptados, implementação das TIC ao nível da educação pré-escolar, ou mesmo a disponibilidade psicológica dos que trabalham em áreas que pela sua natureza colocam mais dificuldades, constituem alguns dos exemplos que dependem dessa discriminação.
O envolvimento das famílias na educação, que o novo diploma pretende reforçar, implica estímulos ao nível da solução de problemas com os quais a escola não pode ser confrontada, pelos quais a qualidade da educação não pode ser responsabilizada.
A desestruturação crescente das famílias, a violência, a exclusão, a falta de respostas à urgência de encontrar trabalho (e não lhe atribuímos o sentido restritivo de emprego), são apenas alguns dos aspectos que a escola não pode controlar.
Os desequilíbrios entre os municípios ao nível da sua capacidade financeira podem inviabilizar a cooperação intersectorial, o investimento público e privado e, em última análise, a realização/concretização do plano de transição dos jovens para a vida adulta, activa ou não activa. Podem mesmo, em tese, originar que se faça "letra morta" das boas práticas integradoras que se pretende que consubstanciem os objectivos da educação especial.
Este diploma não é nosso, do Governo ou do Ministério da Educação; deve ser entendido como um desígnio nacional, porque o País só atingirá um patamar competitivo de desenvolvimento quando olhar para cada um dos seus habitantes, sem excepção, como um recurso potencial.
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