sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Resposta ao Caro anónimo indignado com a indignação dos professores. Nao há como fazer contas.....

 

Genial ironia do colega que se deu ao trabalho em fazer as contas e responder!
Deve ser lido por todos......os portugueses que opinam sem se informarem.·

Caro anónimo indignado com a indignação dos professores...
Caro anónimo indignado com a indignação dos professores, homens (e as
mulheres) não se medem aos palmos, medem-se, entre outras coisas, por
aquilo que afirmam, isto é, por saberem ou não saberem o que dizem e
do que falam.
O caro anónimo mostra-se indignado (apesar de não aceitar que os
professores também se possam indignar! Dualidade de critérios deste
nosso estimado anónimo... Mas passemos à frente) com o excesso de
descanso dos professores: afirma que descansamos no Natal, no
Carnaval, na Páscoa e no Verão, (esqueceu-se de mencionar que também
descansamos aos fins-de-semana). E o nosso prezado anónimo insurge-se
veementemente contra tão desmesurada dose de descanso de que os
professores usufruem e de que, ao que parece, ninguém mais usufrui.
Ora vamos lá ver se o nosso atento e sagaz anónimo tem razão. Vai
perdoar-me, mas, nestas coisas, só lá vamos com contas.
O horário semanal de trabalho do professor é 35 horas. Dessas trinta e
cinco, 11 horas (em alguns casos até são apenas dez) são destinadas ao
seu trabalho individual, que cada um gere como entende. As outras 24
horas são passadas na escola, a leccionar, a dar apoio, em reuniões,
em aulas de substituição, em funções de direcção de turma, de
coordenação pedagógica, etc., etc.
Bom, centremo-nos naquelas 11 horas que estão destinadas ao trabalho
que é realizado pelo professor fora da escola (já que na escola não há
quaisquer condições de o realizar): preparação de aulas, elaboração de
testes, correcção de testes, correcção de trabalhos de casa, correcção
de trabalhos individuais e/ou de grupo, investigação e formação
contínua. Agora, vamos imaginar que um professor, a quem podemos
passar a chamar de Simplício, tem 5 turmas, 3 níveis de ensino, e que
cada turma tem 25 alunos (há casos de professores com mais turmas,
mais alunos e mais níveis de ensino e há casos com menos - ficamos por
uma situação média, se não se importar). Para sabermos o quanto este
professor trabalha ou descansa, temos de contar as suas horas de
trabalho.
Vamos lá, então, contar:
1. Preparação de aulas: considerando que tem duas vezes por semana
cada uma dessas turmas e que tem três níveis diferentes de ensino, o
professor Simplício precisa de preparar, no mínimo, 6 aulas por semana
(estou a considerar, hipoteticamente, que as turmas do mesmo nível são
exactamente iguais -- o que não acontece -- e que, por isso, quando
prepara para uma turma também já está a preparar para a outra turma do
mesmo nível). Vamos considerar que a preparação de cada aula demora 1
hora. Significa que, por semana, despende 6 horas para esse trabalho.
Se o período tiver 14 semanas, como é o caso do 1.º período do
presente ano lectivo, o professor gasta um total de 84 horas nesta
tarefa.
2. Elaboração de testes: imaginemos que o prof. Simplício realiza, por
período, dois testes em cada turma. Significa que tem de elaborar dez
testes. Vamos imaginar que ele consegue gastar apenas 1 hora para
preparar, escrever e fotocopiar o teste (estou a ser muito poupado,
acredite), quer dizer que consome, num período, 10 horas neste
trabalho.
3. Correcção de testes: o prof. Simplício tem, como vimos, 125 alunos,
isto implica que ele corrige, por período, 250 testes. Vamos imaginar
que ele consegue corrigir cada teste em 25 minutos (o que, em muitas
disciplinas, seria um milagre, mas vamos admitir que sim, que é
possível corrigir em tão pouco tempo), demora mais de 104 horas para
conseguir corrigir todos os testes, durante um período.4. Correcção de
trabalhos de casa: consideremos que o prof. Simplício só manda
realizar trabalhos para casa uma vez por semana e que corrige cada um
em 10 minutos. No total são mais de 20 horas (isto é, 125 alunos x 10
minutos) por semana. Como o período tem 14 semanas, temos um resultado
final de mais de 280 horas.
5. Correcção de trabalhos individuais e/ou de grupo: vamos pensar que
o prof. Simplício manda realizar apenas um trabalho de grupo, por
período, e que cada grupo é composto por 3 alunos; terá de corrigir
cerca de 41 trabalhos. Vamos também imaginar que demora apenas 1 hora
a corrigir cada um deles (os meus colegas até gargalham, ao verem
estes números tão minguados), dá um total de 41 horas.
6. Investigação: consideremos que o professor dedica apenas 2 horas
por semana a investigar, dá, no período, 28 horas (2h x 14 semanas).
7. Acções de formação contínua: para não atrapalhar as contas, nem vou
considerar este tempo.
Vamos, então, somar isto tudo:
84h+10h+104h+280h+41h+28h=547 horas.
Multipliquemos, agora, as 11horas semanais que o professor tem para
estes trabalhos pelas 14 semanas do período: 11hx14= 154 horas.
Ora 547h-154h=393 horas. Significa isto que o professor trabalhou, no
período, 393 horas a mais do que aquelas que lhe tinham sido
destinadas para o efeito.
Vamos ver, de seguida, quantos dias úteis de descanso tem o professor no Natal.
No próximo Natal, por exemplo, as aulas terminam no dia 18 de
Dezembro. Os dias 19, 22 e 23 serão para realizar Conselhos de Turma,
portanto, terá descanso nos seguintes dias úteis: 24, 26, 29 30 e 31
de Dezembro e dia 2 de Janeiro. Total de 6 dias úteis. Ora 6 dias
vezes 7 horas de trabalho por dia dá 42 horas. Então, vamos subtrair
às 393 horas a mais que o professor trabalhou as 42 horas de descanso
que teve no Natal, ficam a sobrar 351 horas. Quer dizer, o professor
trabalhou a mais 351 horas!! Isto em dias de trabalho, de 7 horas
diárias, corresponde a 50 dias!!! O professor Simplício tem um crédito
sobre o Estado de 50 dias de trabalho. Por outras palavras, o Estado
tem um calote de 50 dias para com o prof. Simplício.
Pois é, não parecia, pois não, caro anónimo? Mas é isso que o Estado
deve, em média, a cada professor no final de cada período escolar.
Ora, como o Estado somos todos nós, onde se inclui, naturalmente, o
nosso prezado anónimo, (pressupondo que, como nós, tem os impostos em
dia) significa que o estimado anónimo, afinal, está em dívida para com
o prof. Simplício. E ao contrário daquilo que o nosso simpático
anónimo afirmava, os professores não descansam muito, descansam pouco!
Veja lá os trabalhos que arranjou: sai daqui a dever dinheiro a um
professor. Mas, não se incomode, pode ser que um dia se encontrem e,
nessa altura, o amigo paga o que deve.

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